Para José Marques Filho, engenheiro e professor do Departamento de Construção Civil da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a última resolução normativa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre segurança de barragens (nº 1.064, de 2 de maio de 2023), se espelhou na Lei nº 12.334 de 2010, que foi alterada pela da Lei 14.066 de 2020. Todavia, fez novas exigências originadas pelos recentes eventos em barragens de rejeitos, como por exemplo a declaração de estabilidade.
“Apesar de razões válidas, o conceito precisa ser ajustado, e precisamente definido. Será que uma pessoa ou técnico pode declarar estabilidade para um empreendimento que é multidisciplinar”, indaga o professor. “Assim é necessário que todos os aspectos de segurança sejam levados em conta, desde a hidrologia, passando pela geologia e pelas condições gerais de segurança do aproveitamento, incluindo inclusive os equipamentos eletromecânicos”.
De acordo com ele, estabilidade significa estar dentro dos parâmetros considerados adequados, entretanto podem existir incertezas. “Por isso, é preciso ficar claro na interpretação da resolução a necessidade de atendimento a estudos e para isso é necessária a execução de normas e/ou revisões nos guias de boas práticas para evitar dissabores e erros, ou ainda riscos desnecessários”, acrescentou Marques que participou como mediador do 1° Summit de Segurança de Barragens em Florianópolis nos dias 14 e 15 de setembro.
José Marques, que além de professor atua como especialista em projetos e reparos de usinas e em segurança de barragens, concorda com a visão segundo a qual a nova resolução da Aneel deixou margem interpretações que por certos aspectos tipicamente de ação do poder público ficam sob a responsabilidade restrita ao empreendedor. “Atribuir ao empreendedor a responsabilidade de ocupações à jusante é uma exigência a qual ele não tem poder para resolver”, pondera. “É uma questão que deve estar sob guarda do município, do estado; do jeito que foi redigida pode ser interpretada como se misturasse a responsabilidade do estado com o privado’.
Em sua opinião, falta espaço para discussão clara e transparente no sentido de uma definição de matriz de responsabilidade adequada e eficiente. Ele pergunta: “O empreendedor detém o poder de retirar moradores nas regiões de risco à jusante, ou estaria fazendo uma ilegalidade? É uma lacuna que precisa ser resolvida no país. Hoje, observa, há mais participação da sociedade civil e órgãos governamentais depois dos infelizes acidentes, mas são necessárias reuniões constantes para discussão produtiva da situação, além de aparelhar a defesa civil e todas as agências.” Não podemos criticar as pessoas que trabalham no estado, dado ao fato de que é uma questão de estrutura, continua. “Elas fazem o que podem, e eu tenho visto muitos casos de muito comprometimento e trabalho incessante. As prefeituras muitas vezes possuem recursos limitados. Por isso é precisa criar uma matriz de responsabilidade para definir as atribuições do agente público e do empreendedor, trabalhando em avanço e com transparência sem aumentar indevidamente os custos de água e energia”. O especialista também chama atenção para o fato de que muitas vezes as pessoas por necessidade e desconhecimento ocupam lugares de extremo risco no Brasil, em encostas e outras áreas de risco “A mesma coisa ocorre com as barragens. É preciso evitar que as pessoas se instalem em regiões de risco, e é necessário que sejam adequadamente informadas e treinadas em processos de segurança. Nessa linha, é necessária essa interação entre as entidades públicas e o privadas. Além disso, deve ser dada prioridade à prevenção com esforços de engenharia concentrados na melhoria constante da segurança, que é mais efetivo e evita emergências”, conclui.
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